sábado, 12 de novembro de 2011

Fernando Henrique: na corrupção pública, o que era episódico se tornou um sistema

Corrupção e poder

Fernando Henrique Cardoso, O Estado de S. Paulo, 06/11/11

O novo ministro do Esporte, Aldo Rebelo, afirmou recentemente que os desmandos que ocorreram em sua pasta se devem a que as ONGs passaram a ter maior participação na concretização de políticas públicas. E sentenciou: ele só fará convênios com prefeituras, não mais com segmentos da sociedade civil. Ou seja, em vez de destrinchar o que ocorre na administração federal e de analisar as bases reais do poder e da corrupção, encontra um bode expiatório fora do governo.

No caso, quanto eu saiba, é opinião de pessoa que não tem as mãos sujas por desvios de recursos públicos. Não se trata, portanto, de simples cortina de fumaça para obscurecer práticas corruptas. São palavras que expressam a visão de mundo do novo ministro: o que pertence ao “Estado”, ao governo, é correto; o que vem de fora, da sociedade, traz impurezas… O mal estaria nas ONGs em si, não no desvio de suas funções nem na falta de fiscalização, cuja responsabilidade é dos partidos e dos governos.

Esse tipo de ideologia vem associado a outra perversão corrente: fora do partido e do governo nada é ético; já o que se faz dentro do governo para beneficiar o partido encontra justificativa e se torna ético por definição.

Repete-se algo do mensalão. Naquele episódio, já estava presente a ideologia que santifica o Estado e faz de conta que não vê o desvio de dinheiro público, desde que seja para ajudar os partidos “populares” a se manterem no poder. Com uma diferença: no mensalão desviavam-se recursos públicos e de empresas para pagar gastos eleitorais e para obter apoio de alguns políticos. Agora são os partidos que se aninham em ministérios e, mesmo fora das eleições, constroem redes de arrecadação por onde passam recursos públicos que abastecem suas caixas e os bolsos de alguns dirigentes, militantes e cúmplices.

A corrupção e, mais do que ela, o “fisiologismo”, o clientelismo tradicional, sempre existiram. Depois da redemocratização, começando nas prefeituras, o PT - e não só ele - enveredou pelo caminho de buscar recursos para o partido nas empresas de coleta de lixo e de transporte público (sem ONGs no meio…). 

Há, entretanto, uma diferença essencial na comparação com o que se vê hoje na esfera federal. Antes o desvio de recursos roçava o poder, mas não era condição para o seu exercício. Agora os partidos exigem ministérios e postos administrativos para obterem recursos que permitam sua expansão, atraindo militantes e apoios com as benesses que extraem do Estado. É sob essa condição que dão votos ao governo no Congresso. O que era episódico se tornou um “sistema”, o que era desvio individual de conduta se tornou prática aceita para garantir a “governabilidade”.

Dessa forma, as “bases” dos governos resultam mais da composição de interesses materiais que da convergência de opiniões. Com isso perdem sentido as distinções programáticas, para não falar nas ideológicas: tanto faz que o partido se diga “de esquerda”, como o PC do B, ou centrista, como o PMDB, ou de centro-direita, como o PR, ou que epíteto tenham, todos são condôminos do Estado. Há apenas dois lados, o dos condôminos e o dos que estão fora da partilha do saque. O antigo lema “é dando que se recebe”, popularizado pelo deputado Cardoso Alves no governo Sarney, referia-se às nomeações, ao apadrinhamento, que, eventualmente, poderiam levar à corrupção, mas em si mesmo não o eram. Tratava-se da forma tradicional, clientelista, de fazer política.

Hoje é diferente. Além da forma tradicional - que continua a existir -, há uma nova maneira “legitimada” de garantir apoios: a doação quase explícita de ministérios com as “porteiras fechadas” aos partidos sócios do poder. Digo “legitimada” porque desde o mensalão o próprio presidente Lula outra coisa não fez senão justificar esse “sistema”, como ainda agora, no caso da demissão dos ministros acusados de corrupção, aos quais pediu que tivessem “casca dura” - ou queria dizer caradura? - e se mantivessem no cargo. Num clima de bonança econômica, a aceitação tácita deste estado de coisas por um líder popular ajuda a transformar o desvio em norma mais ou menos aceita pela sociedade.

Pois bem, parece-me grave que, no momento em que a presidenta esboça uma reação a esse lavar de mãos, um ministro reitere a velha cantilena: a contaminação adveio das ONGs. Esqueceu que o governo tem a responsabilidade primordial de cuidar da moral do Estado. Não há Estado que seja por si só moral, nem partido que seja imune à corrupção pela graça divina. Pior, que não se possa tornar cúmplice de um sistema que se baseie na corrupção.

O “sistema” reage a essa argumentação dizendo tratar-se de “moralismo udenista”, referência às críticas que a UDN fazia aos governos do passado, como se ao povo não interessasse a moral republicana. Ledo engano. É só discutir o tema relacionando-o, por exemplo, com trapalhadas com a Copa para ver se o povo reage ou não aos desmandos e à corrupção. A alegação antimoralista faz parte da mesma toada de “legitimação” dos “malfeitos”. Não me parece que a anunciada faxina, embora longe de haver sido completa, tenha tirado apoios populares da presidenta. O obstáculo a uma eventual faxina não é a falta de apoio popular, mas a resistência do “sistema”, como se viu na troca de um ministro por outro do mesmo partido, possivelmente também para preservar um ex-titular do mesmo ministério que trocou o PC do B pelo PT e hoje governa o Distrito Federal. Estamos diante de um sistema político que começa a ter a corrupção como esteio, mais do que simplesmente diante de pessoas corruptas.

Ainda há tempo para reagir. Mas é preciso ir mais longe e mais rápido na correção de rumos. E nesse esforço as oposições não se devem omitir. Podem lutar no Congresso por uma lei, por exemplo, que limite o número de ministérios e outra, se não a mesma, que restrinja ao máximo as nomeações fora dos quadros de funcionários. Por que não explicitar as condições para que as ONGs se tornem aptas a receber dinheiros públicos? Os desmandos não se restringem ao Ministério do Esporte, há outros na fila. Os dossiês da mídia devem estar repletos de denúncias. Não adianta dizer que se trata de “conspirações” contra os interesses populares. É da salvaguarda deles que se trata.


O ESTADO DE S. PAULO/ 06/11/11/OPINIÃO/ FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, SOCIÓLOGO, FOI PRESIDENTE DA REPÚBLICA


OTTO WEISSER - Nascido em Zurique, na Suíça, Otto passou a maior parte de sua vida no Brasil, embora suas fotos tenham rodado o mundo e frequentado grandes revistas da Europa e dos Estados Unidos, sem contar as múltiplas exposições que realizou. Especialista em fotografar e filmar mulheres, as garotas de Weisser, sempre mostradas sob um sol tropical, sempre morenas, sempre com lábios de um batom vermelhíssimo, seminuas ou nuas, na praia ou em piscinas, invariavelmente com acessórios de cores fortes — fúcsia, verde-limão, rosa-choque, vermelho — criaram um estilo que dezenas de fotógrafos passaram a imitar

AS AMAZONÇAS

Mulheres-natureza da Otto Weisser. Clique no link abaixo.

http://veja.abril.com.br/blog/ricardo-setti/tema-livre/fotos-incriveis-as-amazoncas-mulheres-natureza-de-otto-weisser/

sexta-feira, 11 de novembro de 2011


É PRECISO SANEAR

Lisboa – A revista Veja, bem recentemente, veiculou matéria de fôlego, pegando 106 cidades brasileiras de mais de 200 mil habitantes e as dissecou, tomando por base 12 questões: emprego, ensino básico, internet, saneamento, criminalidade, renda, coleta de lixo, mortalidade infantil, educação, petróleo e saúde. As mais ricas, invariavelmente, saíram bem em todos os testes. As mais pobres revelam indicadores socialmente contrastantes.

No capítulo do saneamento, a cidade paulista de Americana foi a campeã, apresentando 99% das suas casas servidas por esgotamento sanitário. Vieram a seguir, dentro das "top five", outras quatro cidades paulistas, a saber: Araraquara e Ribeirão Preto, ambas com 98,6% e Franca e Bauru, as duas com 98,5%. Esse é o Brasil maravilha, que contrasta com a realidade do Norte e do Nordeste.

Das 106 cidades as que tiveram avaliação mais negativa foram Arapiraca, em Alagoas, verdadeiro esgoto a céu aberto, com 19,4%; a violenta Marabá, no Pará, com 34,4%; Aparecida de Goiânia, em Goiás, com 36,8%; Santarém, igualmente no Pará, com 40,7%, e Jaboatão dos Guararapes, em Pernambuco, com 47,2%. Esse é o Brasil pobre, marcado pelas injustiças e pela dor.

Saneamento básico (seja a drenagem de águas pluviais e águas servidas, seja o esgotamento sanitário por galeria) deveria ser uma prioridade essencial de todos os governos. Na verdade, não o é de quase nenhum.

Preferem as obras que exteriorizam beleza, a "enterrar votos", como costumam dizer os que fazem política sob o signo da mediocridade. E acabam enterrando mesmo é a vida do povo mais pobre na realidade lamentável das verminoses, das diarreias, de mil doenças que o saneamento evitaria.

Martin Luther King, falando para centenas de milhares de pessoas em sua luta contra a segregação racial nos Estados Unidos, bradou: "I have a dream..." e desenvolveu, a partir daí, uma das mais belas peças oratórias de que já tomei conhecimento. Daqui da minha modéstia, ouso dizer: eu tenho um sonho. Um sonho bonito. Um sonho sensível.

Como gostaria que todas as cidades do Brasil fossem como Americana, Araraquara, Bauru, Ribeirão Preto e Franca! Como gostaria que Arapiraca, Marabá, Aparecida de Goiânia, Santarém, Jaboatão dos Guararapes e todas as cidades do meu Amazonas fossem saneadas em 100%! Como gostaria!

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

COLUNA DO ARTHUR NETO


ANOMALIA VIRA REGRA


 Lisboa – Mais um ministro aparece como tendo desviado recursos públicos. Repetindo, aliás, o modelo Orlando Silva – PC do B: ONGs de fachada devorando verbas e enchendo bolsos privados e caixas partidários.

Desta vez é Carlos Lupi, do Trabalho e Emprego, pasta que virou capitania quase hereditária do seu partido, o PDT. Figura despreparada, reagiu ao flagrante proferindo bravatas e asneiras aos borbotões: “só saio à bala”. Seria até cômico, se não envolvesse realidade tão triste.

Lupi pode até não ter percebido, primário que é, mas sua “resistência” abala a já combalida autoridade da presidente Dilma Rousseff. Deveria ser ela a nomear e demitir seus auxiliares.

Pelo menos é o que penso. Para cérebros mais maliciosos do que o meu, Lula decide o fundamental do governo e lá ficaria sua pupila de mãos atadas, tendo de demitir Orlando Silva, porém mantendo os Esportes com o PC do B. Tendo de elogiar publicamente personagens que caíram porque foram apanhados com a boca na botija da coisa pública.

Lupi cairá. Isso é certo como dois e dois são quatro. Talvez apenas depois da aprovação da PEC da DRU (Desvinculação de Receitas da União), que tem importância fundamental para a ação de governo. Mas cairá. E, lamentavelmente, seu substituto virá do mesmo PDT, o que equivale ao sepultamento de toda e qualquer perspectiva real de investigação. Ia esquecendo: no ato da posse do novo ministro, será louvado também, porque essa virou a praxe de uma ordem esquisita.

Uma criança indagaria aos pais: “ué, mas se essas pessoas merecem esses elogios todos, porque essa senhora malvada os está demitindo?”. Parece um desperdício jogar tanta gente boa fora. À primeira vista soa como sadomasoquismo.

Ou então a senhora não é “malvada” nem os elogios são sinceros. Nesse caso, a criança ficaria sem entender e os pais teriam de explicar: “é que parece que ela não manda no governo dela”.

Texto interessante e muito atual, escrito há 20 anos pela Jornalista Mônica Falcone, de Roma, mostra como o nosso ensino encontra-se defasado, principalmente, aqui na Amazônia. O ensino formal, mesmo em tempos de vacas gordas no mercado de trabalho, nunca nos possibilitou ser nada além de empregados. Hoje, com a super-competição, nem isso ele facilita. As gerações passadas e presentes nunca receberam treinamentos e conhecimentos para serem empreendedores, criativos e investidores. Por isso, julgamos ser oportuno a republicação desse texto, publicado na Revista SuperInteressante, no seu número 49, de outubro de 1991. O titular deste Pré-Blog fez uma especialização em 2001, na S3 Studium, em Roma, Itália.


CRIATIVIDADE SE APRENDE NA ESCOLA (III PARTE)

Por Monica Falcone, de Roma

Instalada há doze anos num prédio do centro histórico de Roma, A S3 Studium ensina seus alunos a serem criativos e os prepara para enfrentar, com sucesso, as necessidades de um mercado de trabalho cada vez mais exigente.

Por Monica Falcone, de Roma

Aproveitando as dúvidas levantadas pelo aluno Antonio Zazzetta. executivo do Instituto Nacional de Previdência Social italiano, o professor explicou que, além da criatividade, as características da empresa pós-industrial são a intelectualização do trabalho, a primazia da estética, a ressurreição dos valores éticos, a feminilização, a valorização da afetividade, a possibilidade de trabalhar longe da sede e em horários diferentes, a importância da individualidade e da qualidade de vida. E exemplos não faltaram.

É evidente, insiste o mestre, a intelectualização do trabalho nas empresas modernas. No século passado, o pensador alemão Karl Marx (1818-1883) observou que para cada 100 operários de uma indústria existiam quatro funcionários de escritório, responsáveis pelo chamado trabalho intelectual. Hoje, dos 14 000 funcionários que a IBM tem na Itália, apenas 400 são operários, chamados de "empregados tecnológicos". É a estética que faz do célebre relógio suíço Swatch um best seller planetário, e não a precisão ou a durabilidade de seu mecanismo.

O sucesso se deve também a uma estratégia de mercado inteligente que impediu a sua vulgarização. Outro bom exemplo é o da empresa Unilever, que conquistou o mercado de sorvetes populares na Itália, a pátria do sorvete, não com receitas particularmente saborosas, mas com a beleza das embalagens e com uma publicidade alegre, musical, que mirava diretamente o consumidor jovem. No Brasil, a Gessy Lever que produz os sorvetes da marca Gelatto, veiculou um anúncio do sorvete Cornetto, nesses moldes.

Quem não se lembra do jovem que passeava de gôndola pelos canais de Veneza e ao cruzar com outra transportando uma mocinha roubava-lhe o sorvete ao som de uma nova versão de O sole mio? A redescoberta dos valores éticos no trabalho e nas empresas foi denunciada pelo faro cinema americano. Nos Estados Unidos, lembra De Masi, o cinema é um veículo importante de transmissão de valores.

Filmes como Wall Street, Uma linda mulher, A secretária do futuro, A fogueira das vaidades, são bons exemplos de como voltou a ser fundamental um comportamento ético tanto da empresa quanto do profissional. Segundo De Masi, as empresas atuais estão totalmente despreparadas para enfrentar aspectos como a importância crescente da subjetividade, da afetividade e da feminilização do trabalho. Para o Professor o caso ocorrido com a missão conjunta inglesa e soviética no espaço, em maio passado, é sintomático.
Os astronautas soviéticos não conseguiam trabalhar com a astronauta inglesa porque ela trocava de roupa com naturalidade no exíguo espaço da nave, e reclamaram ao comando da operação na Terra. "O problema é que ela se trocava na frente deles, mas não ia para a cama com eles. Eles também se trocavam diante dela, mas não aceitavam a recíproca."

Da mesma forma, a maior parte dos executivos não sabe como se comportar com uma colega de trabalho ou uma cliente", constata De Masi Por fim, a última característica das empresas que o professor define como pós-industriais é a possibilidade que a Informática oferece de se trabalhar longe da sede e em outros horários. É o que ele chama de teletrabalho. Significa estar ligado com a empresa através de terminais de computadores e desenvolver suas tarefas em casa ou em escritórios pequenos, distantes da sede.

Pode parecer ficção científica, mas 1,8 milhão de empregados da IBM em todo o mundo já trabalham assim. A Benetton, líder mundial na confecção de roupas esporte, conseguiu explorar bem as vantagens desse conceito: a maior parte da execução das roupas que comercializa é feita por 700 micro e pequenas empresas que realizam o trabalho em suas próprias dependências. Estudos realizados pelo próprio De Masi e alguns de seus alunos demonstraram que se 4% dos trabalhadores de Nápoles trabalhassem em casa, todos os problemas de trânsito da cidade estariam resolvidos e ainda se faria grande economia de combustível.

Na Itália, Nápoles é o exemplo mais acabado de uma cidade à beira do caos, com trânsito praticamente bloqueado, serviços públicos inexistentes e níveis de poluição que já ultrapassaram o estado de alarme.

Para Linda Salerno, funcionária de uma empresa de consultoria e formação de executivos, que questionou o quadro ideal pintado por De Masi e a realidade que se encontra na maioria das empresas, a resposta foi a seguinte: Devemos explorar as potencialidades que conhecemos, responsáveis pela diferença das empresas de sucesso hoje e que serão essenciais para as empresas do futuro. O problema é dos que não querem aceitar a realidade. Com o computador pude reduzir muito as minhas horas de trabalho diárias e produzir mais. Neste caso é inevitável ser um pouco cínico e aproveitar pessoalmente o que se sabe".

Terminada a lição, o grupo de alunos e professor foi a pé até uma das melhores e mais antigas sorveterias da cidade, pouco distante da escola. Ali, entre um sorvete e outro, esteticamente perfeitos, continuaram as citações de Ford, provérbios populares, Borges, Jorge Amado Shakespeare e Fellini.

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Texto interessante e muito atual, escrito há 20 anos pela Jornalista Mônica Falcone, de Roma, mostra como o nosso ensino encontra-se defasado, principalmente, aqui na Amazônia. O ensino formal, mesmo em tempos de vacas gordas no mercado de trabalho, nunca nos possibilitou ser nada além de empregados. Hoje, com a super-competição, nem isso ele facilita. As gerações passadas e presentes nunca receberam treinamentos e conhecimentos para serem empreendedores, criativos e investidores. Por isso, julgamos ser oportuno a republicação desse texto, publicado na Revista SuperInteressante, no seu número 49, de outubro de 1991. O titular deste Pré-Blog fez uma especialização em 2001, na S3 Studium, em Roma, Itália.


CRIATIVIDADE SE APRENDE NA ESCOLA


Instalada há doze anos num prédio do centro histórico de Roma, A S3 Studium ensina seus alunos a serem criativos e os prepara para enfrentar, com sucesso, as necessidades de um mercado de trabalho cada vez mais exigente. (II PARTE)

Por Monica Falcone, de Roma

A primeira lição que se aprende ao entrar na S3 é que o ambiente é fundamental para a criatividade: "Só os superficiais não acreditam na aparência", ironiza De Masi, citando Oscar Wilde. Todo mundo é criativo pelo menos em algum campo. O importante é receber estímulos psicológicos e estéticos do ambiente", assegura o professor, um jovial e bem-humorado cinqüentão, chamado carinhosamente pelo apelido de Mimo. De fato, o clima na escola é alegre, variado e quase festivo, contrastando com a realidade do cotidiano das empresas onde trabalham alguns dos trinta alunos matriculados nas três séries do curso: executivos da indústria ou da administração pública, profissionais recém-formados em Economia, Sociologia, Física e Engenharia.

Nem todos, no entanto, moram em Roma. O engenheiro Pier Luigi Bongiovanni, por exemplo, executivo de uma empresa que produz equipamentos industriais, mora em Bergamo e viaja 624 quilômetros toda semana para assistir às aulas. Alguns estrangeiros que trabalham em Roma também freqüentam o curso. A diversificação da formação acadêmica que mistura engenheiros, físicos, economistas e sociólogosé intencional e é um critério levado em conta nos exames de seleção. "A criatividade pode nascer da faísca entre duas culturas ou pontos de vista diferentes", observa um dos trinta professores que acompanham individualmente, como tutores, a atividade de cada aluno.

Outra lição que o ambiente da S3 ensina é que as pessoas criativas sempre conseguem transformar os próprios limites em vantagens. As instalações da escola são pequenas, mas aconchegantes. Isso permite organizar os alunos em grupos reduzidos, o que aumenta a participação e conseqüentemente o rendimento de todos eles. O restante do programa é individual e estabelecido entre o aluno e seu tutor, que determina os livros a serem resenhados e os estágios a serem feitos. É o tutor quem acompanha também o desenvolvimento de uma pequena tese de pesquisa a ser apresentada no final do ano.

A anuidade para os alunos do 1.° e 2.° ano é de 3 milhões de liras ( equivalentes a quase 900 000 cruzeiros) e para os do 3.° ano. 4 milhões (equivalentes a 1,2 milhão de cruzeiros). Como esse dinheiro mal paga as despesas, a escola recorre freqüentemente a patrocinadores escolhidos entre as empresas privadas e públicas, um dia comum de aula, em junho passado, De Masi precisou descrever uma empresa onde seu dono, geralmente o fundador, centraliza tudo. Criativo, valeu-se de uma frase do novelista francês Gustave Flaubert (1821-1880): "Madame Bovary c'est moi" (Madame Bovary sou eu).

E assim ele prosseguiu a aula com os alunos descrevendo experiências de trabalho. As questões que eles tiveram de resolver se transformaram num exercício coletivo, para provar que um problema pode ter muitas soluções, umas mais criativas outras menos. Já a lição de De Masi sobre "A empresa criativa e a resistência às mudanças", para os alunos do 2.° e 3.° ano, começou com a leitura de uma página do escritor italiano Italo Calvino.

É um trecho de uma conferência sobre os planos de realidade que convivem na literatura. Depois da leitura, cada aluno teve 15 minutos para escrever as questões ou dúvidas que a leitura suscitou em relação ao tema. A discussão dessas dúvidas forneceu material para compor o quadro das características da organização ou empresa onde existe muita criatividade. Descobriu-se, então, que essa empresa não tem a forma hierárquica tradicional de uma pirâmide, onde os quadros dirigentes se situam no topo. Conclusão: uma empresa criativa é estruturada como uma rede em que os pontos de intersecção dos fios, os nós, são os momentos de controle. Por exemplo, numa redação de jornal, um momento de controle seria a reunião de pauta da manhã.

Na empresa criativa os momentos de controle são tão necessários quanto a liberdade de improvisar. Para exemplificar esse conceito, De Masi analisa como são feitas as improvisações pelas bandas de jazz. Um dos pontos de referência fixos é a composição da música sempre em 32 compassos. A seguir cada músico improvisa, mantendo, porém, os 32 compassos como referência. Terminado o improviso, todos os músicos voltam ao ponto de referência fixo inicial e repetem a música em conjunto. (Leiam a última parte deste Artigo, na 6ª. feira). 

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

COLUNA DO ARTHUR NETO


OUTONO

Lisboa – O tempo está chuvoso. E venta muito nesta cidade. O outono alterna dias assim com aqueles outros de temperatura amena em tempo firme, as folhas caindo, talvez a estação mais bonita do ano.

Escrevo num começo de noite de ruas desertas. As poucas pessoas que transitam, o fazem protegidas por guarda-chuvas ou capas impermeáveis. Bate uma melancolia misturada com saudade de casa.

Hoje vejo que não poderia mesmo ser diplomata em tempo integral. Não conseguiria viver longe do Brasil, do Amazonas, de Manaus. Gosto de viajar, porém com retorno certo.

Meus colegas passam temporadas de 10 anos no exterior. Retornam a Brasília por um biênio e, após, se quiserem, partem para outro período demorado fora.

Lisboa é uma cidade linda, de povo amável, culinária inigualável, hábitos metropolitanos. Gosto daqui. Uma amiga me diz que é como se fosse a casa da nossa avó.

Tem o clima mais leve da Europa. A esta altura, a Alemanha já gelou, em contraposição às temperaturas que, nesta capital, oscilam entre 13 e 18 graus. No inverno, descem a cinco, chegando a zero na Serra da Estrela.

Tenho ido muito a livrarias. É uma diversão à parte.

Leio sem parar e tenho uma lista enorme de livros para devorar. Sem falar nos jornais e revistas, que dão conta da crise econômica portuguesa, da zona do euro e, muito agudamente, da Grécia.

Quando voltar, sei que terei acrescentado muita coisa boa à minha vida pessoal e intelectual. Mas a saudade aperta de verdade, volta e meia. É como se fosse um “exílio”, não imposto por poder nenhum e sim escolhido por mim próprio. Nem por isso menos exílio.

A internet encurta certas distâncias. Não todas, contudo. Dá respostas objetivas a indagações que lhe faço; não é capaz de desvendar os segredos da minha alma.

Moro num lugar gostoso, com vista para o Tejo. Ao lado tem uma tasca que serve uma sopa esplêndida. Pela rua passa o “elétrico” (bonde) que, não sei bem a razão, me lembra Fernando Pessoa.

Gosto de ficar na janela à noite, meditando por algum tempo. O pensamento vai longe, carregado pela imaginação.

Dá para vagar pelas ruas em paz. Não existe a figura da violência urbana, tal como a conhecemos no Brasil. Os jovens são mais livres, precisamente porque estão mais seguros. Dominam as praças com alegria e em paz.
A maior paixão dos portugueses é o futebol. Em Lisboa, a maioria é Benfica e uma minoria expressiva torce pelo Sporting. No Porto, claro, todo mundo vai com o time da casa. Rivalidade intensa.

A situação econômica é dificílima, mas, diferentemente da Grécia, (ainda) há consenso interno de apoio às medidas de austeridade impostas por FMI, Comissão Européia e Banco Central Europeu. O povo está sofrendo, confiante em que mergulhará em dois anos de recessão, retomando o crescimento a partir daí.

Doravante, sempre me irei preocupar com Portugal de modo diferente. Mais pessoal, mais emocional.
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MOTOS DA CHINA

Lisboa – A Zona Franca de Manaus perde competitividade a cada dia. A presidente Dilma Rousseff precisa parar de estender a outras partes do território nacional incentivos que as levam a esvaziar o modelo econômico amazonense. E a falta de investimentos em infraestrutura, inovação e formação de mão de obra também vai fazendo estragos. A guerra fiscal movida por Pernambuco leva esse estado a hospedar sua primeira fábrica (chinesa) de motocicletas. Uma 125 cilindradas sairá cerca de 30% mais barata que a similar produzida pela Honda, empresa que agrega mais de 90% de valor nacional e mais de 60% de valor amazonense. Fica evidente que o governo federal deveria endurecer no Processo Produtivo Básico (PPB), beneficiando quem é fábrica de verdade e exigindo mais agregação de valor nacional e local. Enfraquecer o polo amazonense de duas rodas é verdadeiro crime contra o Amazonas.

DEPOIS DE 43 ANOS DE TESTADO NAS ÁGUAS DO RIO AMAZONAS, O HOVERCRAFT - AEROBARCO OU BARCO DESLIZADOR - VAI SE TORNAR REALIDADE, MEDIANTE A VISÃO EMPREENDEDORA DA EMPRESA L I A A - EMPREENDIMENTOS NAVAIS LTDA., TENDO À FRENTE OS IRMÃOS, AMINADAB, ABIATÁ E ADIMAEL.

Clique nos links abaixo para assistir o primeiro teste do Hovercraft, com tecnologia adaptada por amazonenses.

http://www.youtube.com/watch?v=m70oVicNcRc&feature=player_embedded#!

http://www.youtube.com/user/Reginaldo3098?blend=1&ob=5

http://www.blogmarcossantos.com.br/wp-content/uploads/2011/07/CBN-MANAUS-13072011-ADMAEL-SANTANA.mp3

domingo, 6 de novembro de 2011

COLUNA DO ARTHUR NETO


PRORROGAR É POUCO

                                                                                
Um projeto industrial leva, em média, oito anos para amadurecer. Ou seja, como a Zona Franca tem data marcada para acabar (2023), se não vier a prorrogação dos incentivos que a têm sustentado, a partir de 2013 nenhum investimento novo lhe baterá às portas. Nenhuma ampliação acontecerá. O parque industrial estagnaria absolutamente.

Logo, somente pessoas desonestas intelectualmente ou demasiadamente ingênuas podem, de fato, declarar gratidão por um gesto que qualquer presidente, a esta altura do tempo, teria de adotar. Ou seria crível que, irresponsavelmente, deixassem morrer, de morte "morrida" um dos principais centros de produção industrial do País?

Prorrogar é obrigação. Assim como resolver nossos gargalos logísticos e parar de agredir o modelo (como fizeram com a Medida Provisória dos tablets) é uma necessidade extrema.

O ministro Aloizio Mercadante, da Ciência e Tecnologia, declara que já existem oito empresas licenciadas para produzir tablets no Brasil, com isenção de 31% em impostos federais, valendo isso para qualquer parte do País. Leia-se: Centro-Sul, São Paulo à frente.

Pergunto: como poderia a ZFM, distante da malha rodoviária nacional, ilhada, porque sem saída terrestre, sem hidrovias, sem infraestrutura aeroportuária condizente, competir com estados mais ricos e mais bem situados geograficamente, ainda por cima contando com incentivos tão generosos? E vejam que nem computo as isenções estaduais e municipais, que elevam esses 30% para, no mínimo, 40%.

Entre essas empresas estão a taiwanesa Foxconn, a Apple e a HP e as japonesas Samsung e Semp Toshiba. Sempre associei a Samsung ao Distrito Industrial de Manaus. Mais ainda a Semp Toshiba.

Dói muito saber que o governo Dilma as incentiva a produzir tablets fora do Amazonas, deixando de gerar empregos para os nossos irmãos e, bem ao invés, construindo futuro para São Paulo e vizinhos.

Tenho PECs que prorrogam a ZFM. Não peço a ninguém que me agradeça por isso.

Por favor, deixem-me fora desse oba-oba em torno da "generosidade" da presidente Dilma, se sabemos que está na hora de prorrogar e qualquer um concordaria com a prorrogação, se estivesse no exercício da Presidência.

A prorrogação, sozinha, é pouco. Há muito mais a fazer, se queremos ser honestos com o Amazonas e com os amazonenses.
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FUTURO EM RISCO
Lisboa – Mais impressionante do que a coragem de Oldemar Iank, superintendente interino da Suframa, que simplesmente falou a verdade, é a desfaçatez de lideranças (???) políticas nossas, que preferem o conforto do aulicismo a enfrentar a dura realidade: A Zona Franca corre brutal perigo, sim, e não será a pura e simples prorrogação do tempo de validade dos incentivos que irá tirá-la da curva descendente. Os ingênuos devem deixar de sê-lo e os mal intencionados devem ser identificados e isolados. Está em jogo o destino de mais de três milhões de pessoas. Está em risco o futuro do único modelo de desenvolvimento regional que vinha dando certo neste país.


Texto interessante e muito atual, escrito há 20 anos pela Jornalista Mônica Falcone, de Roma, mostra como o nosso ensino encontra-se defasado, principalmente, aqui na Amazônia. O ensino formal, mesmo em tempos de vacas gordas no mercado de trabalho, nunca nos possibilitou ser nada além de empregados. Hoje, com a super-competição, nem isso ele facilita. As gerações passadas e presentes nunca receberam treinamentos e conhecimentos para serem empreendedores, criativos e investidores. Por isso, julgamos ser oportuno a republicação desse texto, publicado na Revista SuperInteressante, no seu número 49, de outubro de 1991. O titular deste Pré-Blog fez uma especialização em 2001, na S3 Studium, em Roma, Itália.


CRIATIVIDADE SE APRENDE NA ESCOLA ( Parte I)

Instalada há doze anos num prédio do centro histórico de Roma, A S3 Studium ensina seus alunos a serem criativos e os prepara para enfrentar, com sucesso, as necessidades de um mercado de trabalho cada vez mais exigente. 

Por Monica Falcone, de Roma

Imagine uma escola onde doze estudantes bem vestidos sentam-se em torno de uma antiga e longa mesa oval de nogueira. Todos falam: ali não existe a divisão tradicional entre professor e aluno. No roteiro da aulas é que existe algum roteiro há uma constante mistura de realidades diferentes. Ouvem-se belíssimas citações do escritor argentino Jorge Luis Borges (1899-1986)"O paraíso existe e está aqui na Terra, o inferno existe e consiste em não saber que aqui é o paraíso" entremeadas a afirmações peremptórias do industrial Henry Ford (18631947)"Os americanos podem escolher todas as cores de carro que quiserem, desde que escolham o preto.

É assim que funciona, em Roma, capital da Itália, a S3 Studium, uma escola vá lá o nome convencionalque se propõe a ensinar criatividade a seus alunos: executivos que trabalham na indústria, na administração pública, na direção de grandes hospitais, empresas de comunicação ou complexos Turísticos. E eles não têm do que se queixar quanto à eficiência do curso. Paolo Vaselli. sociólogo recém-formado, fez uma espécie de pós-graduação na S3 e logo tornou-se um dos profissionais mais disputados da Itália na área de treinamento de executivos. Outro recém-formado, Raffaelo Merli, estava desempregado ao se matricular no curso. Atualmente, executivo da ENI (Ente Nazionale Idrocarburi), a similar italiana da Petrobrás, fareja e pesquisa novidades e avanços na área da tecnologia de combustíveis para serem eventualmente aplicados na empresa.

Hoje, quem procura um emprego bem remunerado em empresas de sucesso, em qualquer ramo e profissão, tem de ser, antes de mais nada, criativo. Sem dúvida, um desafio, pois não se aprende criatividade na escola regular e, quase sempre, se é desencorajado a ousar nas primeiras experiências profissionais. Para suprir essa falha é que o sociólogo Domenico De Masi, catedrático de Sociologia do Trabalho da Universidade de Roma, fundou há doze anos (hoje, 32 anos) a S3 Studium.

Juntamente com o sociólogo francês Alain Touraine e os sociólogos americanos Daniel Bell e Alvin Toffler (autor do best seller A Terceira Onda). De Masi não só identificou o início de uma época pós-industrial como também antecipou muitas das características da organização da indústria e da sociedade em que estamos vivendo.

Nessa nova sociedade dominada pela Informática e na qual as necessidades antes supérfluas como a televisão, o esporte e a moda passaram a ser essenciais, a criatividade é uma matéria-prima preciosa. De Masi acredita que para responder à voraz demanda de novos produtos e modelos do mercado atual, cada vez mais exigente e sensível à moda, é preciso ser criativo-seja para inventar mecanismos de marketing alternativos ou métodos de produção rápidos e econômicos. Quem realizar essa tarefa no menor espaço de tempo, vence o duelo. muitas vezes mortal, com a concorrência.

O professor gosta de ressaltar a importância da criatividade na indústria automobilística; para lançar um novo modelo de carro, as montadoras européias gastam oito anos em preparativos; já os japoneses, trabalhando em grupo e eliminando a tradicional divisão do trabalho, precisam de apenas três. Na tentativa de remediar esta e outras desvantagens do mesmo gênero, os europeus procuram deter a invasão dos carros japoneses, criando obstáculos nas fronteiras.

Na S3 Studium começa-se a aprender criatividade ao atravessar a soleira da porta principal. Os móveis e quadros. por exemplo, foram herdados de cenários dos filmes de Lina Wertmüller, magníficos exemplares de Jugendstil, estilo que vigorava na Alemanha, no final do século passado. É que o apartamento onde a escola funciona pertence ao cenógrafo Enrico Jobi, marido de Lina, amigo de De Masi e responsável pela decoração. Nesse ambiente de bom gosto, profissionais de diversas áreas se encontram durante três anos tempo de duração do curso de pós graduação, denominado Ciências Organizativas. As aulas, concentradas em um só dia da semana, começam às 9 horas e terminam às 17. E a pontualidade é uma das poucas regras da escola. Quem chega atrasado, certamente ouve uma reprimenda. (Continua na próxima 3ª. Feira.)