quinta-feira, 8 de agosto de 2013

O que se deduz do depoimento da Cineasta Beatriz Seigner? Muitas coisas! Porém, comecemos pelo mais simples: "é mais fácil pegar um mentiroso do que um coxo"! O tal de Capilé e a sua mídia alternativa, cuja inspiração e manutenção todos sabemos onde se originam, resume bem o conjunto do legado petista, após os 12 longos anos de um governo que, se não criou a corrupção, a institucionalizou-a na máquina pública, com fortes influência na cultura brasileira. Aqueles que seguem o princípio gersoniano de “levar vantagem em tudo”, facilmente se deixam introjetar pelo vírus da contra-cultura lulo-petista, de que “ver filmes é “perda de tempo” e “que ler livros, mesmo os clássicos, são “tecnologias ultrapassadas”. Para Capilé, que se arvora de ser “criador de uma mídia alternativa para a cultura brasileira”, não tem o hábito da leitura nem de assistir filmes, porque “enquanto o povo brasileiro todo não puder assistir a um filme no cinema, nós também não vamos”. Capilé, que “não têm tempo para perder com estas coisas”, julga irrelevante frequentar e assistir mostras gratuitas de filmes, peças de teatro, dança, bibliotecas públicas, universidades públicas, onde se pode assistir a qualquer aula/curso. Ou seja, Capilé e nem os demais “colaboradores” das casas “Fora do Eixo” não cultivam nada daquilo que eles querem representar.

FORA! FORA DO EIXO...
Do Blog do Reinaldo Azevedo, da VEJA
(Primeira Parte de 3 que serão publicadas neste Blog)

Conheci um representante da rede Fora do Eixo durante um trajeto de ônibus do Festival de Cinema de Gramado de 2011, onde eu havia sido convidada para exibir meu filme “Bollywood Dream – O Sonho Bollywoodiano” e ele havia sido convidado a participar de um debate sobre formas alternativas de distribuição de filmes no Brasil.

Meu filme havia sido lançado naquele mesmo ano no circuito comercial de cinemas, em mais de 19 cidades brasileiras, distribuído pela Espaço Filmes, e o rapaz me contava de como o Fora do Eixo estava articulando pela internet os cerca de 1000 cineclubes do programa do governo Cine Mais Cultura, assim como outros cineclubes de pontos de cultura, escolas, universidades, coletivos e pontos de exibição alternativos, que estavam conectados à internet nas cidades mais longínquas do Brasil, para fazerem exibição simultânea de filmes com debate tanto presencialmente, quanto ao vivo, por skype. Eu achei a idéia o máximo. Me disponibilizei, a mim e ao meu filme para participar destas exibições, pois realmente acredito na necessidade de democratizar o acesso aos bens culturais no país, e sei como é angustiante, nestas cidades distantes, viver sem acesso à cultura alternativa e mais diversas artes.

Foi então organizado o lançamento do meu filme nos cineclubes associados à rede Fora do Eixo durante o Grito Rock 2012, no qual eu também me disponibilizei a participar de uma tournée de debates no interior de São Paulo, na cidade do Rio de Janeiro, e por skype com outros cineclubes que aderissem à “campanha de exibição”, como eles chamam.

Com relação à remuneração eles me explicaram que aquele ainda era um projeto embrionário, sem recursos próprios, mas que podiam pagá-lo com “Cubo Card”, a moeda solidária deles, que poderia ser trocada por serviços de design, de construção de sites, entre outras coisas. Já adianto aqui que nunca vi nem sequer nenhum centavo deste cubo card, ou a plataforma com ‘menu de serviços’ onde esta moeda é trocada.

E fiquei sabendo que algumas destas exibições com debate presencial no interior de SP seriam patrocinadas pelo SESC – pois o SESC pede a assinatura do artista que vai fazer a performance ou exibir seu filme nos seus contratos, independente do intermediário. E só por eles pedirem isso é que fiquei sabendo que algumas destas exibições tinham sim, patrocinador. Fui descobrir outros patrocinadores nos posters e banners do Grito Rock de cada cidade. Destes, não recebi um centavo.

No entanto, foi realmente muito animador ver a quantidade de pessoas sedentas por cultura alternativa em todas as cidades de pequeno e médio porte pelas quais passei. Foi também incrível conversar com cinéfilos por skype de cidadezinhas do Acre, Manaus, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Bahia, Paraíba, Mato Grosso, Goiânia, Santa Catarina, Distrito Federal, Rio de Janeiro, São Paulo, entre outras cidades. Pelo que eu via, tinha entre 50 a 150 pessoas em cada sessão. Eu perdi a conta de quantos debates e exibições foram feitas, mas o Fora do Eixo havia me prometido como contrapartida uma foto de cada exibição onde fosse visível o número de público destas, e uma tabela com as cidades e quantidades de exibições que foram feitas. Coisa que também nunca recebi.

De qualquer maneira, empolgada com esta quantidade de pessoas que não querem consumir cultura de massa, em todas estas cidades, entrei em contato com colegas cineastas e distribuidores para que também disponibilizassem seus filmes, pois via o potencial de fortalecimento destes pontos de exibição em todos estes lugares, de crescimento do número de cinéfilos, e de pessoas que têm o desejo de desfrutar coletivamente de um filme, ou de outra obra de arte, de discuti-la, pesquisá-la, e se possível debatê-la com seus realizadores. Estava realmente impressionada com a quantidade de pessoas em todas estas cidades sedentas por arte. Se eu tivesse nascido em uma delas, via que seguramente seria uma delas, e mal conseguia imaginar como deve ser insuportável viver em uma cidade onde não há teatro, cinema alternativo, e muitas vezes nem sequer bibliotecas.

A ideia seria então de fazer um projeto para captar recursos para viabilizar estas exibições. Pensamos em algo como cada cineclube ou ponto de exibição que exibisse um filme receberia 100 reais para organizar e divulgar a sessão, e cada cineasta receberia o mesmo valor pelos diretos de exibição de seu filme naquele lugar. E caso houvesse debate presencial receberia mais cerca de mil reais de cachê pelo debate, e por skype ao vivo cerca de 500 reais pelo debate de até 3 horas.

Pensando em rede, se mil cineclubes exibissem um filme, o cineasta poderia receber, no mínimo, 100 mil reais por estas exibições. Eu ainda acho que é um projeto que deve ser realizado. E que esta ligação entre os cineclubes deveria ser feita por uma plataforma pública online do governo, onde ficaria o armazenamento destes filmes para download com senha e crédito paypal para estes pontos de exibição (sejam eles cineclubes, escolas, universidades, pontos de cultura etc.). 

Assim como também acho que os “Céus das Artes” que estão sendo construídos no país todo deveriam ter salas de cinema separadas dos teatros, com programação diária, constante, aumentando em 15% o parque exibidor brasileiro, e capacitando o governo de fazer políticas de exibição de filmes gratuitas ou com preços populares, em lugares onde simplesmente não há cinemas, muito menos, de arte. 

Mas isso já é outra história. Voltemos ao Fora do Eixo.

E quando foi que o projeto degringolou? ou quando foi que me assustei com o Fora do Eixo?

Meu primeiro susto foi quando perguntaram se podiam colocar a logomarca deles no meu filme – para ser uma ‘realização Fora do Eixo’, em seu catálogo. Eu disse que o filme havia sido feito sem nenhum recurso público e que a cota mínima para um patrocinador ter sua logomarca nele era de 50 mil reais. Eles desistiram.

O segundo susto veio justamente na exibição com debate em um SESC do interior de SP, quando recebi o contrato do SESC, e vi que o Fora do Eixo estava recebendo por aquela sessão, em meu nome, e não haviam me consultado sobre aquilo. Assinei o contrato minutos antes da exibição e cobrei do Fora do Eixo aquele valor descrito ali como sendo de meu cachê, coisa que eles me repassaram mais de 9 meses depois, porque os cobrei, publicamente.

O terceiro susto veio quando me levaram para jantar na casa da diretora de marketing da Vale do Rio Doce, no Rio de Janeiro, onde falavam dos números fabulosos (e sempre superfaturados) da quantidade de pessoas que estavam comparecendo às sessões dos filmes, aos festivais de música, e do poder do Fora do Eixo em articular todas aquelas pessoas em todas estas cidades. Falavam do público que compareciam a estas exibições e espetáculos como sendo filiados à eles. Ou como se eles tivessem qualquer poder sobre este público. 

Foi aí que conheci pela primeira vez o Pablo Capilé, fundador da marca/rede Fora do Eixo, um pouco antes deste jantar. Até então haviam me dito que a rede era descentralizada, e eu havia acreditado, mas imediatamente quando vi a reverência com que todos o escutam, o obedecem, não o contradizem ou criticam, percebi que ele é o líder daqueles jovens, e que ao redor dele orbitavam aqueles que eles chamam de “cúpula” ou “primeiro escalão” do FdE. 

O susto veio, não apenas por conta de perceber esta centralidade de liderança, mas porque o Pablo Capilé dizia que não deveria haver curadoria dos filmes a serem exibidos neste circuito de cineclubes, que se a Xuxa liberasse os filmes dela, eles seguramente fariam campanha para estes filmes serem consumidos pois dariam mais visibilidade ao Fora do Eixo, e trariam mais pessoas para ‘curtir’ as fotos e a rede deles – pessoas estas que ele contabilizaria, para seus patrocinadores tanto no âmbito público, quanto privado. “Olha só quantas pessoas fizemos sair de suas casas”. E que ele era contra pagar cachês aos artistas, pois se pagasse valorizaria a atividade dos mesmos e incentivaria a pessoa ‘lá na ponta’ da rede, como eles dizem, a serem artistas e não ‘DUTO’ como ele precisava. Eu perguntei o que ele queria dizer com “duto”, ele falou sem a menor cerimônia: “duto, os canos por onde passam o esgoto”. 

Eu fiquei chocada. Não apenas pela total falta de respeito por aqueles que dedicam a maior quantidade de horas de sua vida para o desenvolvimento da produção artística (e quando eu argumentava isso ele tirava sarro dizendo ‘todo mundo é artista’ ao que eu respondia ‘todo mundo é esportista também – mas quantos têm a vocação e prazer de ficar mais de 8 horas diárias treinando e se aprofundando em determinada forma de expressão? quantas pessoas que jogam uma pelada no fim de semana querem e têm o talento para serem jogadores profissionais?” “mas se pudesse escolher todo mundo seria artista” “não necessariamente, leia as biografias de todos os grandes compositores, escritores, cineastas, coreógrafos, músicos, dançarinos – quero ver quem gostaria de ter aquelas infâncias violentadas, viver na miséria econômica, passar horas de dedicando-se a coisas consideradas inúteis por outros - vai ver se quem é artista, se pudesse escolher outra forma de vocação se não escolheria ter vontade de ser feliz sendo médico, advogado, empresário, cientista social.”). 

Blog do Reinaldo Azevedo, Revista Veja, 08/08/2013.

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