MICROCRÉDITO
Antônio Delfim Netto
Talvez um dos fatos importantes a respeito da sociedade
brasileira seja a afirmação de "identidade" de um enorme contingente
populacional que gosta de imaginar-se como "classe média".
Isso, obviamente, não é acidente nem produto espontâneo. É consequência de um
processo civilizatório recente em que as políticas sociais sujeitas a algumas
condicionalidades foram mais bem focadas.
Paralelamente, houve uma "inclusão" desses cidadãos na economia de "mercado" devido ao forte aumento das oportunidades de emprego e ao acesso ao crédito.
Uma das características mais marcantes desses novos cidadãos é a
"internalização" de que o fator mais importante para "subir na
vida" é a conquista da educação para si e para seus filhos, ainda que lhes
custe enormes sacrifícios.
Só não percebe essa ascensão social quem sofre de miopia. É tal ascensão que
vai continuar a permitir a construção de um mercado interno capaz de garantir o
mínimo de economicidade e "incluir" o Brasil, de forma adequada e
relativamente segura, na globalização avassaladora que fragmentou o processo
produtivo.
Esses fatos são visíveis na recente pesquisa feita pela Fondapol (Fondation
pour l'Innovation Politique), em meados de 2011, com jovens de 25 países, em
que se perguntou: 1º) Você acha seu futuro promissor ("prometteur")?;
2º) Você acha o futuro do seu país promissor?
À primeira pergunta 87% dos jovens brasileiros responderam afirmativamente, e à
segunda, 72%. Isso contrasta com os EUA, onde à primeira pergunta 81%
responderam afirmativamente, mas à segunda, apenas 37%. O curioso é que na
China a coisa se inverte: 73% creem que têm futuro promissor, mas 82% creem no
futuro promissor do seu país.
O governo decidiu estimular o Banco do Brasil - agora proprietário do Banco
Postal - e a Caixa Econômica Federal - que controla as "lotéricas" - a
expandirem cuidadosa e seguramente o microcrédito, com taxas de juros mais
acessíveis e menor burocracia, o que deve aumentar a "inclusão"
social.
É importante dizer que, para fazê-lo, não se cogita subsídio do Tesouro ou
violação das garantias exigidas pelo Banco Central, mas, sim, redução da
distância entre os bancos e o tomador de crédito, diminuindo o evidente
constrangimento dos mais pobres de acessarem os bancos.
Isso vai ser feito aproveitando a "imagem" e a reputação secular do
BB e da CEF - que, para os mais simples, significam segurança absoluta. A
economia de escala deve tornar os seus "spreads" mais atrativos do
que os dos bancos privados que só agora começam a "descobrir" os
potenciais novos clientes e vão ter que disputá-los.
FOLHA DE SÃO PAULO / OPINIÃO /
ANTONIO DELFIM NETTO / MICROCRÉDITO / 14.03.2012.
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