UM DEPUTADO PRESO TERIA O DIREITO A CARRO OFICIAL (C0M MOTORISTA) PARA DESLOCAR-SE ENTRE O CONGRESSO E A CADEIA?
REVISTA VEJA, REYNALDO ROCHA
Com os votos de alguns ministros
do STF, inaugura-se uma novíssima tese no Judiciário brasileiro: o
quase-flagrante ─ que, assim como a jabuticaba, só cresce na terra brasilis.
Quer dizer então que os
condenados ─ por sentença criminal transitada em julgado ─ não podem ter
direitos políticos na plenitude (no futuro) mas, por outro lado, podem
continuar a tê-los até que termine os respectivos mandatos eletivos?
Seria o caso de permitir que o
ladrão preso assaltando uma residência termine o “serviço”, ficando proibido de
praticar novos assaltos somente após o término do que começou?
Uma nova figura: a quase
flagrância, que observa o direito do criminoso condenado. Direito de continuar
a delinquir.
Afinal, os deputados condenados
pelo STF não se valeram exatamente do fato de serem deputados para a execução
do crime?
A tese de Rosa Weber é
assustadora. E merece ─ por parte da ministra que tenho como honesta e
competente ─ uma reanálise.
Não foi surpresa o entusiástico
apoio de Toffoli. Que certamente envergonhou a ministra Weber.
Admitir que os condenados percam
os direitos políticos, mas mantenham o status quo atual, chega a ser uma
absolvição dentro da condenação.
Não se trata de interpretar a
Constituição. Seria suficiente se assim o fosse. Afinal, também para isto
existe o STF. É DEVER do STF guardar e interpretar a Constituição. Trata-se de
ferir o espírito da lei, o sentimento do legislador original, vale dizer da
Assembleia Constituinte.
Haveria espaço para o PERDERÁ O
MANDATO (impositivo e não opcional) constante na Constituição, quando membros
do Legislativo são condenados por sentenças transitadas em julgado? Ou até
ministros do STF usarão chicanas jurídicas em defesa do indefensável?
Minha obsessão pela observância
do Estado de Direito me leva a entender que decisões do STF não se discutem.
Mesmo que por vezes eu até chegue
a preferir o “quanto pior, melhor” tão caro ao PT de outrora.
Uma decisão transferida para a
Câmara dos Deputados seria exemplarmente didática.
Chego até a desejar esta
aberração. Veríamos o espetáculo da baixaria legislativa que faria corar as
meretrizes da antiga Zona do Mangue do Rio de Janeiro.
Quais seriam os argumentos usados
pelos deputados para manter na poltrona ao lado um condenado com hora marcada
para retornar à cela? Questões práticas muito interessantes precisariam ser
resolvidas. Teriam direito a carro oficial para buscá-los na Papuda?
Tomariam o
café da manhã na cela ou no restaurante do Congresso, mesmo quando não houvesse
sessões? E nas segundas e sextas-feiras, quando ninguém na Casa de Tolerância
trabalha? Sairiam da cadeia para “dar expediente” nos gabinetes? João Paulo
poderia retornar à presidência da Comissão de Constituição e Justiça, da
qual ainda é membro TITULAR indicado pelo PT? Eles se declarariam
impedidos de votar leis que abordassem matérias penais? Receberiam autorizações
para participar de votações noturnas?
Valeria a pena ver o vexame
consumado.
E poder observar ─ com a não cassação
mais que previsível ─ que, pela lógica dos deputados, freiras podem conviver
com prostitutas no mesmo ambiente, no mesmo grau de importância e dignidade.
Como o voto é secreto ─ para
cassar ou não! ─, veríamos também a troca de posições no escuro do covil.
Ou alguém duvida que muitos dos
que hoje clamam pela ética e moral na Câmara sucumbiriam ao espírito de porco ─
ops, de corpo ─ que os une? Deputados conseguem até revogar a famosa “lei das
putas”: nunca se soube de uma laboriosa trabalhadora do sexo trocar de cliente
dentro do motel! Eles trocam.
Rosa Weber e Carmem Lúcia
(estranho, muito estranho…) perderam o bom senso de que falou o ministro Marco
Aurélio. Toffoli e Lewandowsky já sabíamos: perderam o que nunca tiveram. A
vergonha.
E os saltimbancos comandados pelo
Maia (este sim o verdadeiro fim do mundo anunciado) aguardam ansiosos para
provar a todos nós que são especiais. Acima das leis e da Justiça. Despudoradamente cínicos, a zombar de tudo e todos.
Especialmente de quem foi roubado
e espoliado. Como nós.
Ou alguém acredita que de onde
saíram os ratos sairia a punição? A Câmara Federal não quer defender nenhuma
posição política ou legalista. Quer defender a postura (própria das galináceas)
da absolvição corporativa.
Afinal, rato não mata rato. E, ao
menor sinal de perigo, isolam a ratoeira.
Talvez fosse mesmo melhor deixar
para as ratazanas a decisão do julgamento dos iguais. E deixar que a vergonha
que cobre bandido-deputado cubra também deputados-bandido.
REVISTA VEJA / FEIRA LIVRE / REYNALDO
ROCHA / 11/12/2012