DESRESPEITO
Lisboa
– Leio nos jornais que os peixes estão morrendo asfixiados na Lagoa de
Marapendi, na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. Os "assassinos"
diretos são os elevados volumes de lixo, detritos de toda sorte, que
apodreceram águas outrora saudáveis e belas. Os "mandantes" do crime
são a sucessão de governos que não fiscalizam, a especulação imobiliária, a
desordem urbana que transforma o bonito em feio.
Vi
também, faz algum tempo, a foto solitária de um jacaretinga, insistindo em
sobreviver à podridão de um igarapé de Manaus. Nem sei do que ele se pode estar
alimentando. Talvez tenha aprendido a comer lixo, porque peixe mesmo não tem,
naquele nível tão elevado de poluição.
Existe
uma palavra, não necessariamente mágica, que deveria ser obrigatória na vida de
todos nós: SUSTENTABILIDADE. Produto saído da depredação e da ganância não
deveria ser comprado pelas pessoas e pelas boas empresas. Acho, aliás, que o
mundo marchará nessa direção: se alguém quiser exportar o que produz, cuide de
assegurar o selo verde. O próprio instinto de sobrevivência dos seres humanos
terminará exigindo que seja assim.
Sempre
pode aparecer algum falso "progressista" que indague: "mas ele
está preocupado com os peixes da lagoa lá no Rio de Janeiro e com o jacaretinga
que chafurda na lama de um igarapé manauara? Será que não existem outros problemas
mais graves, envolvendo pessoas, mexendo com fatos mais sérios?" Eu
responderia a essa ponderação ressaltando, em primeiro lugar, que uma
preocupação não impede a outra; ou seja, dá sim para andar e mascar chicletes
ao mesmo tempo. Argumentaria, a seguir, que uma sociedade que deixe degradar a
sua paisagem está construindo a desgraça social e não qualquer coisa parecida
com verdadeiro "progresso". Finalizaria afirmando que o resultado da
especulação imobiliária e do crescimento desordenado é sempre a concentração de
renda nas mãos de poucos privilegiados; os mais pobres ficam com as favelas,
com as moradias insalubres, com a amargura cotidiana.
Vejo
clara ligação entre cidades equilibradas e realizadas na sustentabilidade e
ambiente econômico mais justo. Claro que o inverso, para mim, é verdadeiro:
cidades desequilibradas e "desenvolvidas" à base de ações
irresponsáveis e insustentáveis levam, inevitavelmente, a uma taxa mais elevada
de pobreza e infelicidade social.
Poderia
ser diferente. Deveria ser diferente. Teria de ser diferente.
Poderia
ser melhor. Deveria ser melhor. Teria de ser melhor.
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